sexta-feira, 27 de maio de 2016

Avó Esther e a sabedoria da cura.



Vovó Esther tinha residência em Mogi das Cruzes mas morou em nossa casa por uns tempos e de vez em quando se revezava na casa dos filhos para ajudar com as crianças. A Vó foi parteira de quase todos os netos. Somente não pegou os últimos e os da tia Dirce, que tinha 
Vovó Esther, mamãe, Cibéle e eu ....
mais posses. Era filha de portugueses e casada com um alemão do qual ficou viúva muito cedo. Em Mogi todos a conheciam e a respeitavam pois a chamavam para fazer partos e curar doentes com suas ervas. Era uma exímia conhecedora das plantas que curavam e fazia seus emplastos, chás 
e comidas fortalecedoras da saúde. O pouco conhecimento que tenho sobre isto foi herdado dela e até hoje ainda preservo o uso de algumas ervas.  
Mogi das Cruzes- Casarão da avó Esther- Vista parcial

Uma vez por ano ela fazia uma fila com todas as crianças da família, dava um pregador de roupas 
a cada uma para colocarmos no nariz e "entuxava" uma colher de óleo de rícino para tirar a verminose.
Todo mês ela dava emulsão Scott, um vidrinho com rótulo azul com a figura de um pescador carregando uma vara nas costas com um grande peixe pendurado. Era óleo de fígado de bacalhau. Só a visão do vidrinho era suficiente para me fazer esconder atrás do sofá ou dentro da banheira. 
Avó Esther era uma figura doce e meiga apesar de ser teimosa e turrona, mas tinha o poder do convencimento entremeado com suas histórias de castelos e princesas.
Lembro bem de que quando era preciso dar as suas "poções de saúde", ela sempre justificava o gosto ruim com lindas estórias e nos convencia com ilusões e promessas que nos tornaríamos tão fascinantes como aquelas personagens.
Por exemplo, ela sempre nos dava um pozinho chamado ruibarbo e dizia que aquilo era uma maquiagem. Falava que as princesas, ao invés de usarem "rouge", tomavam aquilo para terem suas faces coradas naturalmente.
Outro fortificante que nos dava (mas este era gostoso) vinha acompanhado da estória dos índios. 
Ela pegava um tronquinho de guaraná, desbastava com um pequeno ralador e misturava o pó que 
se formara com água e um pouquinho de açúcar. Depois disso, colocava as frutas meticulosamente sobre a mesa e dizia que aqueles "olhinhos" da fruta iriam nos observar até tomarmos o último gole. Para coroar a ação, arrematava falando que os índios nunca ficavam doentes pois todas as manhãs tomavam a mesma coisa e aqueles "olhos" faziam com que tivessem uma visão aguçadíssima para
caçar e enxergar bem longe. 


Fruto do guaraná


Quando tínhamos uma gripe muito forte ela preparava.. uma garrafada. Ia até Mogi para pegar 
ovos de pata e mentruz de sua horta medicinal. Ela batia no liquidificador os ovos, a mentruz, 
Biotônico Fontoura  e leite condensado. Isto era dado às colheradas durante o dia. 
À noite ela preparava uma canja forte, feita com muitos pés de galinha, pois  dizia que nos pés das galinhas existia uma gelatina que fazia nossa pele ficar bem lisinha e sem rugas. Quando a canja ficava pronta nos sentávamos à mesa e meu pai enchia uma concha com vinho tinto e colocava a medida em cada um dos pratos, pois era fortificante.
Sem contar as gemadas matinais que eram preparadas cuidadosamente com uma gema batida com açúcar, canela e uma taça de vinho do Porto. Dizia que o segredo da gemada era bater muito as gemas com o açúcar até ficarem bem branquinhas, só depois acrescentava-se os ingredientes e de vez em quando ela colocava umas casquinhas de limão raladas.
Quando tivemos "coqueluche" (tosse comprida), ela nos agasalhava bastante, com gorro e luvas e íamos a pé da casa da velha até o outro lado da Avenida do Estado, pelos lados do Gasômetro, onde tinha um reservatório de gás. No pátio havia uma estrutura metálica redonda imensa, cujo centro se movimentava para baixo, como um grande pistão e conforme ele abaixava o cheiro de gás se espalhava no quarteirão. Segundo a vó, respirar aquele cheiro de gás por um tempo, curava a coqueluche. Havia muitas crianças por lá com bronquite e outras doenças respiratórias. 
Antigo Gasômetro, entre o Cambuci e o Brás


Até hoje não compreendo a ligação científica/ intuitiva disto, mas sei que a nossa tosse comprida fora curada.
Uma vez por semana éramos obrigadas a comer bife de fígado. Intragável até hoje , para mim. 
Mas tínhamos que comer, disfarçado com tomates, cebolas ou embutido em alguma outra comida . Quando tínhamos febre ela colocava cebolas em rodelas grandes e amarrava com lenço em nossos pés depois de banhá-los em uma bacia com água quente e sal. 
Para dor de cabeça e também para a febre ela fazia uma bandana com várias rodelas de batata e colocava em nossas testas e na fronte.
O famoso chá de "cipó cruz "que até hoje tomo e que cura as minhas enxaquecas, era um depurador do fígado e do estômago . Amargo mais que fel , ruim demais , mas um santo remédio. 
Quando íamos para Mogi na sua hortinha medicinal, ela nos dizia que as mesmas ervas que curam também podem matar.  
Ela frisava muito a diferença na colheita da erva  "cipó cruz ",pois era facilmente confundida com a cicuta e nascem muito próximas umas das  outras.
Pena eu não ter escrito ou registrado todo este conhecimento empírico de minha vó. Era uma grande conhecedora da medicina e da cosmética natural. Ela, particularmente, nunca usava remédios. Quando tinha que tomar algum medicamento prescrito pelos médicos e obrigada pelas filhas, ela ficava furiosa. Fazia de conta que tomava e mamãe ou Yayá encontravam todos os comprimidos em seus bolsos das roupas. 
Ela guardava todas as cascas de frutas e legumes e muitas vezes pela manhã encontrávamos a vó com todas estas cascas no rosto. 
Um dia era mamão, no outro pepino e assim ia ....
Quando as crianças nasciam ela fazia uma pasta com clara de ovo e passava nas cabecinhas dos recém nascidos e colocava uma touca apertada. Dizia que aquilo era para deixar a cabeça bem redondinha e não com aquela cabeça chata de "nordestino".
Ela sabia exatamente os alimentos que lhe faziam mal.Ela tinha bronquite  e reumatismo. Dizia que quando chupava laranja lima aquilo lhe provocava as dores do reumatismo ou quando tomava muito leite sua bronquite atacava. 
O único remédio que ela tomava era o famoso Beserol que tirava as suas dores reumáticas.
Mas só aceitava tomá-lo quando a dor era insuportável.
Minha avó não tinha varizes nas pernas e sua pele era muito lisa e macia como um pêssego.
Sei que esta sabedoria curava muita gente e sinto ter perdido este conhecimento. 



quinta-feira, 26 de maio de 2016

Mais sobre as festas.


O Natal e Final de Ano também tinham seus rituais e costumes.
Lembro que sentava com minha mãe umas semanas antes para escrever a cartinha do Papai Noel. 
Às vezes ela escrevia e eu copiava e lembro que, talvez pensando em nosso futuro, ela sempre orientava para pedirmos uma jóia. Escrevíamos e colocávamos sob a árvore que era montada na sala.                                             
A cartinha para o Papai Noel


Na véspera do Natal, que  geralmente passávamos na casa da Yayá ou em casa, papai ia ao Mercadão Municipal para as compras.
Lembro que eu ficava encantada ao ver aqueles barris com azeitonas enormes. Eu sempre amei azeitonas ! Aquele colorido me fascinava. Olhava aqueles queijos imensos e imediatamente me lembrava de Tom e Jerry. As frutas coloriam meus olhos. Em todos os boxes que parávamos eu recebia um pedaço de queijo ou salame para degustar.
Meu pai levava duas sacolas de feira as quais voltavam cheias. Lembro bem das compras. 
Papai comprava azeitonas verdes e pretas, um pedaço grande de queijo cheio de furos e aliche. 
Depois íamos nas frutas secas e ele comprava ameixa, uva passa, nozes e castanhas e na sequência 
era a hora das frutas frescas: pêssegos, uvas e ameixas . 
Tomávamos o ônibus, voltávamos e entregávamos para mamãe. Lembro do cheiro do Natal. 
O ar era carregado de um cheiro  próprio da época e quando íamos para a casa da Yayá também havia um cheiro especial de assados e doces. 
Na casa da Yayá, onde se reunia toda a família, a surpresa era quando o tio Josino abria a grande cesta de Natal, feita de vime e lotada de produtos especiais que só comíamos nesta época. Mas a surpresa maior era achar dentro da cesta, no meio das palhas , o "boneco Amaral " que a cada ano pertencia a alguém. O Sandro tinha um grandão. Às vezes ele vinha pequeno, outras ele era grande. O boneco Amaral era um tipo de gigante , eu acho, sem camisa e musculoso com calça azul e careca.
Creio que era o mascote das "Lojas Amaral ", se é que existia esta loja. Era muito gostoso tudo isto !!!!
Depois da ceia íamos para casa dormir e colocar o sapatinho novo na porta do quarto para que no dia 25 achássemos o presente entregue pelo Papai Noel . 
A expectativa mal nos deixava dormir. A nossa ansiedade era acordar muito cedo e abrir a porta do quarto. No meu imaginário, ficava instigada como o Papai Noel entrava em casa pois não tínhamos chaminé. Eu acreditava que ele entrava pela chaminé da fábrica e depois caminhava pelos telhados até a casa velha. Mas nossos pedidos sempre foram atendidos, senão em sua totalidade mas o pedido maior sempre estava lá. Depois de brincar com os presentes voltávamos para a Yayá para o almoço. 
O Final de Ano era em casa e Yayá trazia seus quitutes e um peixe enorme.... Toda a alegria se repetia 
e esperávamos mas uma virada ......

Chaminé da fábrica Petracco & Nicolli
(que para mim era a entrada do Papai Noel)


Os pequenos passeios e preparativos festivos.

Minha mãe, eu  e  a gaita na porta da
Dona Mariquinha, onde vivia o galo.

Para estas festas pudessem acontecer lembro que tinha uma movimentação diferente e uma espécie de divisão de tarefas. Fosse em casa ou na Yayá.
Ao meu pai cabiam as compras. Algumas datas eram tradicionais e ficaram muito marcadas: a Páscoa,  o Dia das Crianças, o Natal e o Fim de Ano.

Nos dias que antecediam os eventos, havia uma espécie de peregrinação. Eram preparos e tradições que se mantiveram por muito tempo. De minha parte lembro que havia uma grande expectativa e euforia pois tinha um significado e um gosto de coisas diferentes, mesmo se repetindo a cada ano. 

Não sei como faziam com o dinheiro. Os recursos eram escassos e lembro que tudo era muito controlado. Mas me parece que guardavam o pouco que tinham para manterem estas datas vivas.
Acho que se programavam durante um ano todo para poderem cumprir esta espécie de dever . 
Digo isto pois tudo que eu tinha era coroado de um grande valor e sentia que envolvia um esforço descomunal por parte de meus pais nestas pequenas conquistas. Havia uma espera ansiosa, por exemplo, por um sapatinho novo. Era gosto de grande acontecimento. Íamos a pé do Cambuci até a Rua da Moóca, numa fábrica de sapatos que meu pai conhecia. Experimentava o sapato escolhido e lembro que a caixa era trazida por mim e pela minha irmã como um grande tesouro ou uma jóia. 

Lembro-me até de uma passagem, com a gente um pouco mais crescida. Numa destas saídas para a compra dos sapatinhos do ano, meu pai recomendava : "Não precisam dizer para as pessoas o que fomos fazer e o que fomos comprar . Não interessa para elas ". Geralmente isto acontecia aos sábados e como íamos a pé,  na volta descíamos pela Rua dos Alpes e encontrávamos todos os vizinhos. E na volta, carregando nossos tesouros, a Cibéle com sua caixinha na mão e eu com a minha , passamos na frente de uma barzinho que vendia de tudo e muitos se reuniam ao sábado perto da hora do almoço , quando um amigo de meu pai nos abordou e se dirigiu à Cibéle e disse :  "- Ah, ganhou sapato novo , não é ....? " e a Cibéle, na maior ingenuidade, com a típica caixa de sapatos, virou para ele e disse :  
"- Não, não é sapato novo .... é pão !!! "
Aquilo provocou uma gargalhada geral no barzinho e lembro apenas de meu pai meio sem graça,
se despedindo de todos e nos tirando dali para voltarmos para casa e curtir nossa aquisição !!!!

Na época da Páscoa também tínhamos um ritual. No sábado anterior saia com meu pai para comprar vários ovos de chocolate. Íamos a um lugar que não sei descrever onde era, mas meu pai escolhia 
ovos de vários tamanhos e colocava numa caixa . Talvez fosse uma fábrica de doces ou um distribuidor.
No sábado de Aleluia, íamos a Rua Lavapés ver a malhação do Judas que era muito tradicional 
e passávamos no Peg Pag para comprar os faltantes.  No domingo de Páscoa , enquanto minha mãe preparava o almoço , saíamos com meu pai para distribuir os presentes. Lembro que levantávamos cedo e íamos passando pelas casas. Íamos no tio Aristides, depois passávamos na casa da tia Thereza 
e do tio Juca, no meu padrinho, na Yayá e outras casas de parentes .Voltávamos para casa, almoçávamos e corríamos para abrir os nossos . Ficava fascinada e curiosa para abrir as duas partes e saber que surpresa vinha escondida dentro daquela guloseima. Só podíamos abrir os ovos depois do almoço. 

No Dia das Crianças podíamos pedir um único presente e a maior diversão era quando meu pai nos levava ao 'Salão da Criança", uma feira com todos produtos infantis e voltávamos carregadas de brindes.  Os que mais gostávamos eram as miniaturas de produtos como a lata de leite Ninho, lata de leite condensados, de sabão em pó, pois brincávamos na "copinha"e guardávamos nos pequenos armários. 

Também ganhávamos livros tridimensionais. Lembro de um particularmente , onde a casa da Branca 
de Neve era composta de vários produtos Arno ou Walita , não lembro bem.... 
Mas era uma cartolina dura que quando aberta os personagens saltavam e cada anão tinha um produto : uma enceradeira, um liquidificador, uma batedeira, etc... e podíamos mudar os objetos de lugar . Era o máximo . Guardei isto por muito tempo. Creio que até o inicio da adolescência . 

sábado, 21 de maio de 2016

As festas.


Muitas coisas aconteceram na "casa velha". Uma movimentação comum eram as festas. 
Algumas que lembro bem, outras que me foram contadas para avivar a memória e outras revividas através de fotografias.
Os aniversários de minha irmã e o meu eram temáticos. Lembro que minha mãe e minha avó começavam os preparativos quase uma semana antes. O meu primeiro aniversário foi uma festa memorável . Como  nasci no dia de São Pedro, último dia das Festas Juninas, toda a comemoração
foi com este tema .
Minha mãe fez um bolo na forma de um balão. Meu pai, com todas as habilidades que tinha, montou a estrutura para o bolo ser encaixado. Na mesa tinham todos os aparatos feitos pelo meu pai: a fogueira, as bandeirinhas, bonequinhos dançando quadrilha. Tudo feito por ele.
Meu pai contratou um sanfoneiro e a casa ficou cheia. Parentes, vizinhos e amigos. O quintal de frente também fora preparado e era quase uma extensão da rua . Lá fora o quarteirão também havia sido fechado.
Lembro pouca coisa desta festa mas alguns quadros tomam vida em minha mente. Outros são avivados pelas fotografias tiradas pelo meu pai, pois ele também era fotógrafo de corridas de motocicletas e tinha todos o material para isto: tripé , máquinas fotográficas , lentes e filtros ( guardo até hoje).

Uma cena viva é a do sanfoneiro.
As imagens trazem a figura dele sentado no sofá que fora colocado no quintal frontal e eu dançando na frente do músico conforme as canções ecoavam no burburinho. Lembro de meus padrinhos, dos meus tios e da Yayá e do Josino . E também do tio Pedro que fazia aniversário no mesmo dia que o meu .
A tia Yayá era figura constante pois era uma excelente quituteira e ajudava a minha mãe. Além do que a YaYá adorava festas . Seu marido, o tio Josino, era militar e enfermeiro . Trabalhava nesta profissão dentro do Jockey Clube de São Paulo.
Participou da Revolução de 32 e em todo 7 de setembro se paramentava, arrumava os poucos fios de sua careca com "Glostora "e se banhava com "Água de Cheiro ". Esta cena se repetiu muito , até a minha adolescência .
Dizem que foi a melhor festa da rua.
Depois veio o aniversário de minha irmã . Dia 08 de julho . O tema foi o campo e minha mãe preparou um bolo em forma de "carrocinha "puxada por um cavalo (que serviu de brinquedo por muito tempo).
Lembro que dentro da carrocinha haviam maçãs reluzentes e uma bonequinha vestida de camponesa puxando a cordinha do burrinho.
Na mesa, flores e árvores enfeitavam o entorno.
Outras festas como casamentos, natais e finais de anos eram feitos no apto da Yayá na Vila Mariana. Além de alguns almoços de domingo que eram deleitados e saboreados com quitutes que só comíamos nestas ocasiões 
Estas tradições marcaram muito a minha vida pois havia um respeito, um compartilhamento .
Lembro que nos almoços de domingo, tanto em casa  como na Yayá , ninguém comia antes de todos estarem presentes. Só sentávamos à mesa quando meu pai ou meu tio se serviam e aí era o sinal para avançarmos
Quando a família foi crescendo, pelo menos na casa da Yayá, era montada uma mesa só para as crianças. Todos os primos se sentavam , rindo, brincando e se deliciando com as iguarias preparadas.
O Sandro, o primo mais velho, sempre fazia brincadeiras que fascinavam os mais novos. Tinha uma preparação como se fosse um show.
Às vezes ele armava uns lençóis e todos ficavam embaixo, no quarto da YaYá e do Josino. Todas as luzes eram apagadas, as janelas fechadas e ele contava histórias de terror. Outras vezes o show era pirotécnico. Lembro que ele ficava de ponta cabeça, com calças de jeans. Num determinado momento, ele pegava um isqueiro e punha fogo em sua bunda, provocado pelos numerosos "puns"do almoço deglutido.
Mas era tudo uma grande diversão. E muitas outras brincadeiras aconteciam como o "passa anel ", "corre cotia na casa da tia ", canções e "esconde e esconde ".
Apesar das dificuldades e o dinheiro escasso que tínhamos durante as semanas, os domingos sempre eram alegres e esperados .
Os tios bebiam vinho de um grande garrafão que vinha de Andrada. Lembro que meu pai colocava o garrafão sobre os ombros e entornava nos copos vazios. Tio Josino só gostava de whisky que, segundo dizem, ele ganhava no JocKey Club os importados e guardava as garrafas para serem preenchidas com whisky nacional.
Estes encontros familiares e as datas tradicionais das festas se repetiram por muitos e muitos anos e foram preservadas enquanto estas pessoas viveram e perpetuadas enquanto valores internos .

Tio Zé, tio Aristide, Zé Carlos e o Sandro comigo .....em nossas viagens pelo interior...


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As enchentes do Tamanduateí.

Desde que me lembro convivi coma as enchentes do Tamanduatei. Nas épocas de chuvas lembro que todas as casas colocavam comportas de madeira em suas entradas. Inclusive na minha. Todos os móveis eram suspensos e a casa se transformava.
Era uma correria pois as águas subiam rapidamente. Meu pai também tinha uma preocupação enorme com a fábrica.
Os bombeiros ficavam a postos para socorrer e ajudar em todos tipos de ocorrências. Os vizinhos se ajudavam e estocavam alimentos pois não se sabia quantos dias iriam durar as águas.
Quando começava a vazão, lembro de todo mundo com botas de borracha, lavando as calçadas.
As fábricas usavam bombas para puxar a água do interior. Era como se fosse uma grande faxina pois ficava muita lama.
Não sei com exatidão a data e o ano que saímos da casa mas o dono da fábrica estava construindo um pequeno prédio do lado oposto da rua, no número 156.
Creio hoje que a intenção não era salvar e abrigar os funcionários e moradores das casas mas sim de expandir a fábrica com a demolição dos sobrados que ficavam exatamente entre as partes da fábrica. Minha memória não traz com exatidão os acontecimentos e sua sequência cronológica mas lembro de mudanças nas conversas de meus pais como se estivessem se preparando para uma nova etapa. Lembro apenas que a referência de nossa moradia denominava-se "casa velha, o que perdurou por muito tempo,    inclusive quando contávamos fatos na vida adulta.